Abre espaço para importantes reflexões a decisão do presidente do Senado Federal, Garibaldi Alves, de devolver ao Planalto a Medida Provisória 446, que renova automaticamente, ou seja, sem a devida análise, o certificado de filantropia de mais de 2.200 entidades.
A medida tem o mérito de instituir critérios novos e aperfeiçoados para a concessão do certificado de filantropia. Porém, contém o grave defeito de contemplar, na renovação automática dos certificados, entidades de reputação duvidosa, inclusive aquelas consideradas suspeitas de corrupção pela Operação Fariseu, realizada em março pela Polícia Federal.
A oposição, naturalmente, comemorou a atitude de Garibaldi, na medida em que ela pode trazer desgastes ao governo. Esse, contudo, é um enfoque acanhado.
O próprio líder do governo na Câmara dos Deputados, Henrique Fontana, admitiu as falhas da MP. Fontana admitiu também que faltou diálogo com o Congresso – tanto com a base aliada quanto com a oposição.
Isso remete ao ponto fundamental: a necessidade premente de se estabelecer, no Brasil, um sentido mais democrático e republicano nas articulações entre Executivo e Legislativo. Esse não é um problema surgido no governo do presidente Lula. Ele é, na verdade, uma das marcas da nossa história político-institucional.
Nos períodos autoritários da vida política brasileira, o Congresso foi silenciado, tendo sido várias vezes fechado pelo Executivo. Nos períodos democráticos, inclusive o atual, iniciado com o fim do regime militar, o nosso parlamento vem assumindo, na maioria das vezes, um papel subalterno perante o Executivo.
A mudança no rito de tramitação das Mps, ora em discussão na Câmara, aponta em sentido contrário. No entanto, mais importante ainda é o fortalecimento de uma cultura do diálogo e da concertação, no relacionamento entre Executivo e Legislativo.
Sob uma perspectiva ampliada, essa cultura deve, igualmente, se espraiar como norma do relacionamento entre todos os atores políticos. Isso se aplica ao Brasil e ao mundo.
No âmbito interno, as últimas eleições para prefeito e vereador tornaram mais complexo o quadro partidário do país, em função do excelente desempenho do PMDB e da expressiva ampliação da representatividade de alguns partidos, entre eles o PSB. Na esfera internacional, agrava-se a cada dia uma crise econômica que nenhuma força política ou nação, isoladamente, é capaz de resolver.
A postura assumida pelo presidente do Senado pode ser lida de diferentes maneiras. A melhor delas, certamente, é a que aponta para uma mudança em nossos processos de tomadas de decisão, de modo a fortalecer a negociação e o protagonismo dos diferentes atores e instituições.
Rodrigo Rollemberg (PSB-DF)
Deputado federal